terça-feira, 30 de novembro de 2004

O fim do Gato Fedorento

O tempo é de reflexão. Há que parar, pensar, e tirar as devidas ilações desta crise. Sem medos, com frontalidade, apelando sempre à serenidade. Pois bem, a única análise séria que há a fazer, aquela que verdadeiramente importa às portuguesas e aos portugueses, é a que tem como conclusão a afirmação que intitula este post. Note-se: a 13 de Julho escrevia RAP o seguinte:

«Não se surpreendam, portanto, se o blog retomar a actividade dos primeiros tempos. Que diabo, Santana Lopes está no poder. Alguns posts escrevem-se praticamente sozinhos.»

Passados 4 meses e 12 dias, repito, 4 meses e 12 dias, o Gato Fedorento brindou-nos com 31 novos posts, repito, 31 novos posts. É uma questão de fazer as contas. Se nem com PSL a coisa foi ao sítio, então é caso para dizer, fazendo um esforço para conter as lágrimas, que o Gato morreu. Dona Chica ter-se-á assustado.

Venha a constituição, a federação, o exército, o hino, o presidente, o governo, as directivas todas que quiserem, o vital moreira, mais o camandro

P.S: Se não causar muito incómodo podiam vir também os ingleses. Muito agradecido.

Mais uma razão para votar «Sim»


E a Venezuela será livre

Chaves caiu: vêm aí eleições. O povo já elegeu o seu candidato:


segunda-feira, 29 de novembro de 2004

Também já não acredito no Pato Donald

«Whatever the appeal of Disney's lands, as a political ethic it represents the tyranny of engineered happiness and consensus. It is undergirded by the fundamental notion that conflict disrupts the satisfaction of consumption and hence the constrution of identities through the purchase of yet more artifacts. Instead, conflict is essential to maintain a democratic society, which is why Disney's attempt to achieve cultural legitimacy through programmed versions of history and through architectural patronage is so troubling. By 1995, Disney controlled one of the biggest television networks in the United States, ABC, which would put major newscasts into its hands. Disney's linkage of freedom and free-market spreads into more realms while its architectural patronage reinforces its cultural image as benign and innocuous.»

Architecture After Modernism, Diane Ghirardo, 1996

Aos poucos vão caindo

Se algum dia escrever a minha biografia, o ano de 2004 vai merecer um capítulo especial. O que não é mau sinal. Espero que assim continue: que todos os anos pareçam merecer um capítulo especial na história por contar.

Há razões e razões para isto. Não me interessa revelá-las todas, até porque as que não importam revelar não são as mais significativas. As outras sim.

Aos poucos vou desistindo. Poderia dizer que mudei, que estou a mudar. Mas não é isso. Vão caindo convicções artificiais. Coisas que sempre preferi serem verdade, apesar de para nisso acreditar ter sido sempre necessária uma boa dose de jogos de cintura argumentativos. Ontem, uma gota no copo de água. Já não dá para gostar de futebol, não o futebol português. Não sendo do Benfica. Não sabendo que o actual «estado das coisas» prefere os Sokotas e os Karadas ao Roger, emprestado lá para o Brasil. Esse sim, sabe tratar a bola, tem alegria no que faz e dá alegria a quem vê. Como aquele miúdo do Sporting, o Carlos Martins. Já não gosto de futebol. O Milan, o meu outro clube, há muito que representava o declínio do Calcio como espectáculo. Uma equipa onde Gattuso, Pirlo, e Seedorf podem jogar juntos, mas onde Kaká e Rui Costa não. Em Espanha ainda se consegue ver qualquer coisa, mas só ao nível do Barcelona, Real Madrid ou Corunha. Alguém perde tempo com um Albacete-Numancia? Mas é em Inglaterra que ainda mora a última esperança. Aí ainda se pode gostar de futebol, ainda nos dão razão para isso. Não falo de um Liverpool-Arsenal, mas sim de um Bolton-Aston Villa, ou de um Tottenham-Everton. O prazer do jogo em si, da coisa pura, do estádio cheio.

O futebol para mim acabou. Acreditem, isto é caso sério.

depois deste artigo já só posso votar Sim

A ideia é simples: a União Europeia não vai «crescer demograficamente» porque discute o «aborto» (não discute, mas isso é outra questão) e as «famílias alternativas», originando o «desnorte» e a «corrupção», o que só pode significar, como diz o Papa, que a Europa está a «matar os seus filhos».

O fanatismo e a demência não têm limites. A capacidade que César das Neves tem de explicar o mundo inteiro e os seus pecados através das questões morais é das tentativas mais ridículas que tenho visto de justificar a importância social da Igreja.

É por estas e por outras, é por estas e por outras...

domingo, 28 de novembro de 2004

pelas mesmas razões que me fazem gostar do logotipo do Che

Avante, camarada, avante,
Junta a tua à nossa voz!
Avante, camarada, avante, camarada
E o sol brilhará para todos nós!

neo

Ao ler sobre a história do pós-modernismo, não o pós-modernismo mas tudo aquilo que aconteceu depois do modernismo, fica-se com a sensação que tudo foi inconsequente e meio disparatado. Sejamos neo-modernos, então.

sexta-feira, 26 de novembro de 2004

Mais Veneza 2

Apetece(u)-nos fazer algo impossível: perdermo-nos intencionalmente. É fácil de explicar o porquê da impossibilidade da coisa. Imaginemos a situação, quero perder-me. Ora, se é uma vontade explícita a sua realização é um objectivo atingido. Ou seja, chegado o momento em que poderemos dizer estamos perdidos, estaremos exactamente onde gostaríamos de estar, isto é, num sítio desconhecido e estranho. Logo não estamos perdidos, porque estamos onde desejámos estar. Parece-me claro.

Acontece que nos perdemos. Algumas vezes, dentro do possível, já que Veneza é demasiado pequena para o acontecimento. Rialto, o Guetto Judeu, a fondamenta nuove, e depois o desconhecido, até que se descobre a proximidade de San Marco, onde alguém conhecido estava realmente perdido, à procura do caminho para a biblioteca. Para trás ficaram alguns locais que se reconheceram mas que não seria possível descobrir por decreto.

eu até sou capaz de encontrar um ou dois exemplos do género em Portugal

«Throughout Europe and the Unitet States, too many brash Postmodernist designs of the 1980s seemed to embody no dreams beyound wealth and power.»

Architecture After Modernism, Diane Ghirardo, Thames & Hudson Ltd, 1996, exemplar adquirido na loja da Peggy Guggenheim Collection, vista sobre o Grande Canal, mais umas bases-de-copo-versão-turista-com-motivos-vaporetto

Fogo de vista?

Não vou ser cínico: gostei de ler a entrevista de Helena Roseta ao Independente (felizmente on-line). Gostei de ler, por exemplo, que «o PS não está preparado para governar», ou então que «Carmona Rodrigues é uma pessoa competente, que conhece os dossiês e que tem uma ideia para a cidade.» Está certo que o actual PS não corresponde ao PS que Helena Roseta gostaria, mas ainda assim vejo aqui uma vontade de independência política que só fica bem ao Presidente da Ordem dos Arquitectos. Vamos esperar pela prática.

Mais Veneza

Veneza, para mim, é a ilha distante que aprisiona alguém. Ainda que ela não esteja em Veneza.

A pergunta do tratado

Parece-me que há dois cenários possíveis. Primeiro: aceita-se que a Europa é uma inevitabilidade lógica e vota-se sim, numa manifestação de boa fé de quem se pronuncia no escuro; segundo: acha-se que isto tudo cheira mal e que vai acabar numa federação com os alemães e os franceses a mandar e portanto vota-se não.

Eu já decidi: votarei dependendo do meu estado de espírito nesse dia. Assim mesmo. Para o lado que estiver virado.

quinta-feira, 25 de novembro de 2004

eu avisei

O que dizer? Que é um museu? Que está condenada? Que não é uma cidade, é outra coisa qualquer para a qual parece ainda não haver nome? Para quê? Isto só importa a quem lá vive, e quem lá vive não quer ler sobre Veneza, quer é de lá sair.

fatalidade

Tenho a certeza que se escrever sobre Veneza vai ser merda. Merda concerteza.

e o céu afinal esteve azul

Não terá sido do ambiente sereníssimo (a espaços possível por entre orientais e americanos), mas voltei mais convicto no que importa e menos convicto no que não importa (cada vez mais contraditório).

quarta-feira, 17 de novembro de 2004

O céu não deverá estar tão azul


Canaletto

Olhe que não, olhe que não, ou, O liberalismo não tem cabimento no planeamento urbano

«Os PDM são um instrumento extraordinário. As cidades surgem desenhadas em mapas pintados de verde e variações de castanhos condizentes com áreas de edificação de maior ou menor densidade, zonas históricas, tracejados para indicar novas vias, enfim, um planeamento verdadeiramente soviético. Sim, pois que tal «Plano» organiza, atribuiu ou retira caracteristicas a terrenos e propriedades sejam estas públicas ou privadas. Sem que os respectivos critérios sejam óbvios, claros, uniformes ou, no mínimo, razoáveis.(...)»

Gabriel Silva, no Blasfémias

terça-feira, 16 de novembro de 2004

O efeito do orçamento

O Classe Média acabou.

meu deus

No quase em português:

Alguém perguntou ao Sr. K., se existia um deus.
Sr. K. disse: "Aconselho-te reflectir se o teu comportamento se alterava, devido a resposta a essa pergunta. Se não se alterava, podemos deixar cair a pergunta. Se ele se alterava, posso ajudar-te ainda até este ponto, em que posso dizer-te, que já te decidiste: Tu precisas dum deus."

(Bertolt Brecht)


A minha crise é esta: o meu comportamento não se alteraria. Mas dizer que, com base nisto, não preciso de um deus é arriscado. Deus (seja ele qual fôr) não deve precisar de nós. Como acreditar num deus que existe ou deixa de existir com base na nossa ideia sobre isso?

Pois, João

Mas olha quem continua ali, como Vice-Presidente.

Obrigado Lobo Antunes

Meio embriagado pelo ambiente celebrativo do quarto de século de manuscritos levados à estampa, decidi, finalmente, ler qualquer coisa do homem. Decidi que iria começar pelo Memória de Elefante, pareceu-me bem. Durou dez páginas. Não consegui. Admito, fui vencido. Realmente Lobo Antunes tem razão: o que ele escreve só vai ser entendido daqui a uns anos. Se ele diz quem sou para contrariar? Ainda zonzo, corri para a FNAC, atropelando uns gatos pelo caminho, e saí de lá com dois Paul Auster que ainda não tinha lido. First things first.

segunda-feira, 15 de novembro de 2004

Guia



Em Barcelona comprei um dos melhores (senão o melhor) guias de arquitectura que já vi: BARCELONA 1860-2002. A GUIDE TO ITS MODERN ARCHITECTURE. É perfeito: uma divisão em temas cronológicos irrepriensível; resumos (bastante sintéticos, claro) dos respectivos períodos de crescimento da cidade; um relação muito conseguida entre a apresentação das obras e a sua localização; uma capa resistente à água; desenhos e esquemas essenciais mas não mais do que isso. Enfim, um convite muito bem feito. Se conseguirmos dar-lhe atenção quase que vemos a cidade crescer à nossa volta.

sábado, 13 de novembro de 2004

De Cerdá ao Fórum

Jorge Figueira foi a Barcelona e trouxe de lá um texto que, apesar da falta de brilho, diz muito a quem lá esteve recentemente. Claro que diz coisas que eu não compreendo. Como por exemplo:

«A artisticidade - a "genialidade" - de Gaudí entra muito bem no nosso tempo; as filas intermináveis para ver os edifícios são esclarecedoras.»

Apesar da minha relação pouco pacífica com Gaudí (prefiro os ambientes mais tranquilos, como em La Pedrera, ao rocócó-Art-Nouveau-chamem-lhe-o-que-quiserem do Park Guell, por exemplo), não aceito que as «filas intermináveis» sejam um sinal que Gaudí entra «muito bem no nosso tempo», bem pelo contrário: só mostra como Gaudí não entra bem em tempo nenhum, colocando-se num universo próprio digno de ser atracção. Aliás, parece-me descabida a comparação entre Gaudí e o zeitgeist Moderno:

«Gaudí veicula a ansiedade pelo "novo" que caracteriza a passagem do século, e que depois finalmente surgirá estabilizada no Movimento Moderno. »

O novo não pode ser tão generalizável. O novo de Gaudí não é o mesmo novo do Movimento Moderno. Não é por acaso que Gaudí se sedimentou como um fenómeno regional e único, confundindo-se com Barcelona, e que o Movimento Moderno tenha tido o seu apogeu na definição de Philip Johnson, o Estilo Internacional.

O urbanismo de Cerdá, esse sim, entra «muito bem no nosso tempo», como refere JF:

« A grelha regular de Cerdà recorta as colinas que envolvem a cidade, antecipa a mobilidade do nosso tempo, mas permite também "domesticidade", sentido de pertença, presença do humano.»

Mas aqui não há «filas intermináveis».

Deixo o último parágrafo, que como mandam as regras são as linhas mais inspiradas do texto, onde JF se redime da comparação inicial para atirar Gaudí para o universo que lhe compete:

«Em 2004, Barcelona continua a ser um laboratório urbano, um lugar onde as mutações políticas e culturais são expressas no território, na organização e mediatização do espaço. Talvez faça parte desta "urbanidade" mais indecifrável visitar Gaudí como objecto de ficção científica e colocar o Pavilhão de Barcelona na categoria de ex-futuro. E achar pueril que a Torre Agbar, de Jean Nouvel, "fálica" e cintilante, queira competir com a Sagrada Família, ainda, e sempre, em construção. »

Não resisto a propôr a continuação da conversa em textos publicados na minha outra casa:

Gaudí
Barcelona

ambos escritos em finais de Agosto, depois da minha passagem pela cidade.

sexta-feira, 12 de novembro de 2004

Barba e cabelo

Desde que escrevo em blogues (sempre quis dizer isto no plural) as minhas idas ao barbeiro (recuso-me a falar de «cabeleireiro de homens») resultam sempre em posts. O que não surpreende: o barbeiro é um local extremamente contraditório e um observatório priviligiado do comportamento humano (masculino). Contraditório porque é um sítio onde os homens vão tratar de si, introduzir alterações ao seu corte de cabelo. Faz-se aqui a devida nota: falo do barbeiro, não dessas modernices que há agora. Falo de barbeiros onde os funcionários se confundem com o mobiliário. Onde os funcionários são heterossexuais e têm normalmente para cima de sessenta anos. Os balcões são de madeira, bem conservadora. Eis o meu barbeiro, que por sinal até tem escrito «Cabeleireiro de Homens» escrito na vitrine, em neón, ambos comletamente inutilizados, a vitrine e o néon. O sítio é uma instituição e um regalo para qualquer conservador que se preze: está exactamente na mesma desde que me lembro.

E do que é que se fala? Há dois tipo de clientes de barbeiro: os que falam e os que ouvem. Eu sou, naturalmente, dos que ouvem. Estar de ouvidos bem atentos num barbeiro é meio caminho andado para se entender o país: futebol, política, televisão e, não esquecer, o clima. Hoje, quando entrei, o dono e um cliente falavam. Corrijo, o cliente falava e o dono do estabelecimento ia concordando, o que só revela muita experiência e diplomacia: alguém confia o seu corte de cabelo a quem não apresenta as mesmas opiniões políticas? Pois. O senhor falava alto, muito alto, denunciando a sua vontade em ser ouvido. Apanhei a conversa a meio. Berrava-se contra o governo. O cliente, o tal que orava com eloquência, explicava que não se importava até de ser governado por um «comunista sério», e que tudo era preferível ao actual executivo. Passados não mais do que dois minutos, o rumo político das observações mudava (para os mais distraídos): «ao menos o outro, que morreu à trinta e tal anos, nasceu pobre e morreu pobre, disso não o podem acusar, e até deixou os cofres do estado bem cheios!» Sentava-se na cadeira da outra ponta. Eu, quieto e mudo, escutava. Escutava também o proprietário, que agora já tinha uma distância suficiente que lhe permitia deixar de concordar. Confidenciou-me: «Eu nestas coisas o melhor é não discutir. Porque se ele deixou os cofres cheios, também deixou um país analfabeto. Olhe, como eu, que aos vinte e seis anos fui para a escola aprender a ler e a escrever. Não há pior que um país onde as pessoas não sabem ler nem escrever.»

Trinta segundos depois, o tempo de me perguntar como queria o cabelo (levando a resposta de sempre: igual mas mais curto), já o assunto mudava: «Então, acha que vamos ter um fim-de-semana com sol?»

quinta-feira, 11 de novembro de 2004

Morreu Arafat

Coisa que me é totalmente indiferente. Importante, sim, é saber que a arquitectura portuguesa continua a passear-se em grande estilo pelos cenários internacionais. Depois da grande presença na Bienal (chegada ao fim no Domingo passado), eis que surge a exposição do Design e da Arquitectura de Portugal na Trienal. Os senhores que andam para aí a apregoar um Portugal Positivo mais as empresas e o camandro que ponham os olhos nisto.

quarta-feira, 10 de novembro de 2004

prémio

Souto Moura ganhou o Secil. Não terá havido nos últimos anos prémio mais concensual que este. O Estádio do Braga, além de ser um estádio, logo muito na moda por cá, recebeu elogios de toda a sociedade, chegando mesmo a alertar o próprio Souto Moura que em entrevista revelou-se preocupado por ninguém criticar a obra. Souto Moura já tinha ganho o Secil, com a Casa das Artes. A evolução da sua obra nestes últimos 10 anos fica bem representada com o contraste entre as duas obras premiadas, principalmente na questão da escala. O Estádio do Braga e, principalmente, o Metro do Porto, confirmaram Souto Moura como um dos grandes arquitectos a nível mundial actualmente. E já se fala no Pritzker...

Só pode

Devo dizer, sobre o último post, que discordo frontalmente de Renzo Piano nesta matéria. Se há coisa que marca a história do Homem (e logo a sua medida) é a vontade de chegar mais alto. As grandes catedrais góticas são «fora da medida do homem»? E como pode Piano acreditar nisto ao mesmo tempo que desenha o edifício mais alto da Europa (e a nova sede do New York Times, por exemplo)? Eu não consigo perceber. A única explicação que encontro é esta citação ser falsa. Só pode.

Faz o que eu digo, não faças o que eu faço

«Creio que nunca deveria ter existido uma época de arranha-céus como as Torres Gémeas, desmesuradas, fora da medida do homem e da proporção urbanística.»

Renzo Piano, in www.arq.com.mx (não encontro o sítio exacto), citado na Arquitectura e Vida

Ora bem, parece que temos aqui um problema. É que Renzo Piano, o mesmo que considera as Torres Gémeas «desmesuradas», está a projectar o edifício mais alto da Europa, a London Bridge Tower. Ou seja, Piano considera os 410 metros de altura do World Trade Center «fora da medida do homem», mas, presume-se, já não faz a mesma afirmação sobre os seus 310 metros em Londres. Querem mais complexo e contraditório?

terça-feira, 9 de novembro de 2004

eu também

«PRECISO MESMO DE UMA: Ando mesmo precisado de uma. Já não aguento mais.

Primeiro, vi anúncios nos jornais. Depois, recorri a sites. Sempre trazem fotos e a gente não vai ao engano. Embora, reconheço, as fotos também enganem. E as qualidades que apregoam se revelem muitas vezes falsas, numa linguagem excessiva e cansativa.

De qualquer modo, todas as que me pareceram realmente boas são demasiado caras. Não tenho dinheiro que chegue. Porém, não desisto. Procuro outras. Estou mesmo mesmo precisado de uma.

É muito difícil, isto. Comprar casa.»


in Fora do Mundo.

OA

Amanhã, de manhã, terá lugar numa certa e determinada instituição mais um acto ilegal e estúpido. Amanhã, de manhã, vão esfregar-se umas costas e lamber-se umas botas.

segunda-feira, 8 de novembro de 2004

Twilight Zone


Parece que o paradoxo de Zenon tem solução. Acho isso uma grande aldrabice. Aquiles nunca conseguirá atingir a tartaruga. Principalmente porque quando isso está perto, a entrega é adiada.

sexta-feira, 5 de novembro de 2004

Faltou dizer

que é amanhã, Domingo, à meia-noite. De domingo para Segunda. Logo, não é Domingo, é Segunda. Às zero horas. Ou Domingo. Às vinte e quatro.

Depois não digam que eu não avisei

«Está confirmada a estreia, no início de Novembro, do programa O EIXO DO MAL, uma cabala organizada pelas Produções Fictícias para discutir o Estado da Nação.
Os participantes – todos devidamente inspeccionados e aprovados com carimbo de qualidade pelas mais altas instancias sanitárias – são: Clara Ferreira Alves, Daniel Oliveira, José Júdice, Pedro Mexia e Nuno Artur Silva, que fará a apresentação e moderação.

O EIXO DO MAL é um programa semanal, de 50 minutos, sobre a actualidade política, social e cultural do país. Também serão discutidos temas sérios.

Um programa para debater, bater e, certamente, para abater.

Para processos judiciais será instalada uma Linha Verde.»

Abstract painting

«On Abstract Painting
or
'I don't Get it!'
I've often seen people stare at an abstract painting, then turn to their friend and say "I don't get it", as if they were looking at a blackboard of mathematical equations by Einstein. But it's not difficult to understand at all. An abstract painting is a painting that doesn't look like anything. It doesn't look like a book, or a tree, or a person. It just looks like paint.

You may say 'then what's the point?' Let me explain to you.

You have two lines

Line "A" is a smooth 's' shaped curve

Line "B" is a jagged line like a streak of lightning.

Which is more soothing?

If you answered seriously you said "A". But how can a line on a piece of paper have emotion or meaning? Yet you just said it did!

Question 2. Imagine in your mind 2 paintings:

Painting "A" is a light pastel yellow painted circle in a pink square

Painting "B" is a dark grey painted circle in a black square.

Which of the 2 appears happier in mood? If you answered like most you chose "A". But how can pure color be happy or sad? Yet you just said it did!

And when you get a very sensitive painter that has practiced his art for decades and that expresses his feelings not only through line and color, but through composition, brushstroke technique, shapes, depth perception, etc. etc. etc., you can get a very stirring and emotional painting; yet, it still does not look like a book, or tree, or a person.

In fact, without any pictorial boundaries getting in the way, the painting can communicate its mood, or feeling often even quicker than so called realism paintings.

You may have looked at abstract paintings and said, "My kid can do that." But trust me, when it comes to the few that are extremely talented in this type of art, your child CANNOT do that. Not even the 95% of OTHER abstract painters trying all their lives to do that - can do that!

Now go look at that abstract again.»


Tirado daqui.

quinta-feira, 4 de novembro de 2004

Nota:

Claro que as maquetes do João e os Móveis Correia surgem como alternativa a esta desilusão. Usei-os porque isto é a blogosfera, e são já um clássico por estas bandas. Goste-se ou não da tua arquitectura (coisa que não posso dizer porque nunca a "vivi") é evidente que é algo que nasce de uma vontade forte. E já agora acrescento o Livro de Obra também, e os fascinantes relatos do crescimento da "coisa". Esse pilares de betão na fachada, por exemplo, é algo que não consigo identificar com nada, é novo. E portanto, só por isso, já valeu a pena a sua construção. Se calhar noto uma influência «Vicentiana» (o termo existe? pode usar-se?): o fascínio pela manipulação dos materiais «vulgares», e modos de expressão correntes. O gesto que é aparente nesse edifício é uma manipulação hábil do elemento «pilar de betão» (merda, não estou a gostar de escrever isto, parece que me coloco numa posição qualquer que não me agrada, de falta de humildade). Outros, para se tentarem colocar no mapa, escolheriam um material invulgar de revestimento, por exemplo. E essa tua atitude remete para um teu texto que foi publicado no JA, que me lembro bem: a arquitectura como a arte do possível.

A Arquitectura, os panfletos imobiliários, as maquetes do João e os Móveis Correia

«A nossa preferência pelas casas é porque nelas a arquitectura ainda hoje goza de uma certa liberdade, pois o resto é tão regulamentado, tão seriado.»

Manuel Aires Mateus, em entrevista à Arquitectura e Vida 54, Novembro 2004

Curiosa condição a que se vive hoje. Nunca a arquitectura esteve tanto na moda. O próprio Eduardo Prado Coelho disse-o, portanto deve ser verdade. Hoje a arquitectura passeia-se com a tranquilidade de quem está em casa nas páginas dos jornais. Por todo o lado é difundida. Gehry vem cá, e Santana não perde a oportunidade para se deixar fotografar ao seu lado; Foster vem cá, e Guta Moura Guedes fala do quarteirão do Design; Renzo Piano passa de raspão e deixa um mega-projecto habitacional em Braço de Prata; Siza projecta e Santana referenda; e entretanto o Taveira continua à solta.

A curiosidade da condição relaciona-se com o que está a acontecer à arquitectura por causa disto. Nunca a representação da arquitectura foi tão sedutora. Alguém, que não arquitecto, perde um segundo a olhar para um alçado de Frank Lloyd Wright? Ou para uma axonometria de Corbusier? Não, porque esses desenhos eram o meio, o veículo, um caminho para tentar explicar uma intenção. Hoje esse desenho passou a ser mais importante do que o que representa. A imagem tomou conta do objecto. Paradoxalmente, e isso é muito frequente, hoje acontece que projectos já construídos continuem a ser divulgados através de imagens virtuais. Porquê?

Como diz Aires Mateus, a arquitectura está excessivamente seriada e regulamentada. Não apenas nos aspectos técnicos da construção, nem nos requisitos programáticos que se instituiram, mas também no gosto que se difunde. Basta dar uma volta na Expo (peço desculpa, sou reaccionário, para mim será sempre "a Expo") para se constatar a uniformização pobre do gosto dos edifícios de habitação. Há uma cartilha que é seguida, uma cartilha que parece agradar ao "cliente" e à agência imobiliária.

Como é que isto aconteceu? Porque razão coabitam estes dois fenómenos? Por um lado parece haver um interesse generalizado pela arquitectura, mas por outro esse interesse revela-se num nivelamento da ideia de arquitectura.

Acredito que a culpa está nos arquitectos. O facilitismo da produção de imagens retirou espaço para a invenção. Para o desejo, a vontade, a ideia. Há um contraste claro entre quem usa uma maquete para comunicar uma ideia, e entre quem a usa como objecto central da sua criação. Há um contraste claro entre quem deita as maquetes todas para o lixo depois da obra estar concluída (porque obviamente perderem a sua utilidade), e entre quem as guarda numa redoma para exposição ao público. As únicas maquetes que merecem ser guardadas são as que representam projectos não construídos. As outras só servem para iludir. Perder esta atracção pela perfeição da representação é meio caminho andado para o assumir da coisa construída.

Calma, calma. Não quero que andemos todos a "inventar" em cada esquina. Tenho uma consideração muito grande pela ideia do "pronto-a-vestir", pela arquitectura anónima mas competente. Os Terraços de Bragança, por exemplo. A cidade é feita por esses bocados que se juntam, que não querem o palco só para eles. No entanto é impossível deixar de reparar que a arquitectura se deixou encurralar pelas grandes estrelas. Há uma certa polarização radical das ideias. Ou seja, tudo o que são ideias relevantes de arquitectura só existem nos grandes projectos dos grandes mestres. A arquitectura da pequena escala, do pequeno orçamento, aquela que não aparece nas revistas nem nos portfolios, não admite ideias, só admite o cumprimento regrado dos preceitos da cartilha. O cliente assim o quer, o promotor assim o quer, o arquitecto assim descansa. Para quê ter ideias se ninguém as vai ver? Para quê ter ideias se não vão ser publicadas? Para quê ter ideias se isso não vai trazer a fama, e provavelmente vai entrar em conflito com quem está a pagar a coisa?

Tudo isto incomoda. O aburguesamento do gosto e a demissão do arquitecto. Helena Roseta como presidente. Manuel Vicente arredado da sala de aula. O 3D Studio como brinquedo preferido. A uniformização. A uniformização. A uniformização. O branco igual. A «profissionalização». O «modo de fazer». O é assim. É assim.

Resolução:

Tentar, com todos os meios, evitar começar frases com "E", "Mas", "Contudo", "Talvez", "Porém", "Etc.".

Freitas II

E há mais. Freitas disse que, basicamente, «Bush» só teve uma ideia, a ideia do combate ao terrorismo, que conseguiu passar. O «Senador Kerry», por seu lado, é um «intelectual», um homem «culto», e que tinha no seu programa «25 brilhantes ideias». Ora, Bush ganhou porque ninguém consegue reter 25 «brilhantes ideias». Mas, professor, Kerry é um «intelectual»? Mas que género de «intelectual»? Talvez um Derrida, não, promovendo a destruição do discuro e da total falta de conteúdo objectivo das palavras? Talvez isso explique o seu flip-flopping constante. Não sei. Ficamos com esta. O «Senador Kerry» era um «intelectual».

E o Freitas também

Outra vez na Sic-Notícias. Freitas do Amaral, comentando as eleições, falava de «Bush» e do «Senador Kerry». Poupem-me.

Parem de cavar

«Os blogs de esquerda andam a tentar descobrir como é que a vitória de Bush foi possível. E as hipóteses são muitas. Por causa do voto religioso, porque afinal o Kerry era um meias tintas, porque o Kerry não era bom candidato, porque os americanos ficaram com medo do terrorismo. Eu creio que não descobrirão a resposta enquanto não considerarem hipóteses radicalmente novas. A de Bush ser de facto o melhor candidato. A de Bush ser o presidente que os americanos precisam. A de que Bush não ser, nem de perto, nem de longe, estúpido. A de a América ser radicalmente diferente da Europa. A de os intelectuais europeus estarem na sua generalidade errados em relação ao mundo em que vivem. Enquanto estas hipóteses não forem seriamente consideradas, eles nunca vão encontrar a resposta. Meus caros, há um fosso cultural entre a Europa e os EUA. Parem de cavar. »

Nós também temos pena

Roseta Recandidata-se para "Mudar Muito Mais"

«(...)"Tenho pena que não haja uma lista na oposição", disse Roseta (...)».

Mas não dá para calar este doido de vez?

«Bush não pode ser indiferente ao facto de ter o mundo inteiro contra ele, e metade da América contra ele, ainda por cima a melhor América.»

Mário Soares, na Sic-Notícias

Agora sou obrigado a uma dupla citação

O plano era simples: citar João Pedro George, que depois de um texto absolutamente obrigatório sobre Possidónio Cachapa (mas que se fosse sobre outro qualquer seria obrigatório na mesma) descreve a sua noite eleitoral. Acontece que agora sou obrigado não só a citá-lo mas também ao Pedro Mexia, porque é a via que tenho para citar o maradona, já que não tive acesso à conversa. Tudo sobre esta coisa de ser de direita.

terça-feira, 2 de novembro de 2004

ainda para aqueles que não perceberam à primeira

«I believe totally in a Capitalist System, I only wish that someone would try it»

«Democracy is the opposite of totalitarianism, communism, fascism, or mobocracy»

Toma lá, Corbu. Toma lá, Oscar. Toma lá, Rem. E toma lá mais: «A free America, democratic in the sense that our forefathers intended it to be, means just this: individual freedom for all, rich or poor, or else this system of government we call democracy is only an expedient to enslave man to the machine and make him like it.» (Notar bem a palavra individual.) Notar bem.

vamos em directo para a sede de campanha

«Maybe we can show government how to operate better as a result of better architecture»

Maybe.

o meu voto

segunda-feira, 1 de novembro de 2004

{ }

«Abrir vazios é uma dimensão fundamental da arquitectura de hoje.»
Manuel Salgado, em entrevista à Arquitectura e Vida 53, Outubro 2004

James Hetfield

Escrevi o post anterior ao som de Metallica. Há muito tempo que não ouvia Metallica, a única banda de que fui seriamente fã durante a adolescência. Mesmo isso ganha outro sentido. (A música que se segue, que obviamente me recuso a referenciar, foi motivo para grandes debandadas de fãs, irados com a comercialização do quarteto da Califórnia. Sempre achei que foi o exactamente o contrário: foi preciso tomates, garanto, para fazer uma coisa destas. E tão boa.)

So close, no matter how far
Couldn't be much more from the heart
Forever trusting who we are
and nothing else matters

Never opened myself this way
Life is ours, we live it our way
All these words I don't just say
and nothing else matters

Trust I seek and I find in you
Every day for us something new
Open mind for a different view
and nothing else matters

never cared for what they do
never cared for what they know
but I know

So close, no matter how far
Couldn't be much more from the heart
Forever trusting who we are
and nothing else matters

never cared for what they do
never cared for what they know
but I know

Never opened myself this way
Life is ours, we live it our way
All these words I don't just say

Trust I seek and I find in you
Every day for us, something new
Open mind for a different view
and nothing else matters

never cared for what they say
never cared for games they play
never cared for what they do
never cared for what they know
and I know

So close, no matter how far
Couldn't be much more from the heart
Forever trusting who we are
No, nothing else matters

mudança constante

Sempre tive a tendência para relativizar. Tudo. Encontro sempre na mudança constante ("mudança constante", bela expressão) de pontos de vista um prazer que se assemelha ao da criança que descobre um brinquedo novo. O referencial não tem a origem definida, e isso agrada-me. Se estou com A, defendo B, e se estou com B, defendo A. Pelo meio aprende-se e apura-se a máquina. Os poucos assuntos que não eram alvos de relativismos foram aos poucos caindo, e hoje não conheço nenhum. Posso dar o exemplo da arquitectura, mas isso não chegaria. Esta atitude não tem explicação. Nem revela falta de convicções, entou convicto. O que é uma convicção? Convicção política? Moral? Artística? Não servem para nada. Einstein provou-o numa expressão. Tudo é relativo.
Acontece que desde há algum tempo vivo com algo que não se sujeita a qualquer tipo de relativismos. Não é fácil de explicar. É o meu "0,0,0" há muito flutuante. O ponto de onde as outras coisas se medem. E se comparam. Claro que isto dá um grau de liberdade para os outros relativismos ainda maior. Tudo o que não precise de pôr em causa a origem perdeu o ténue fio que o agarrava, e soltou-se, ficando alvo fácil das brisas e correntes. Quando se tem uma âncora deste tipo a confiança cresce. Isto espanta quem vê de fora, que esperava uma acalmia do estado do mar, e vê a ondulação subir de meio metro para dois metros. Fica por explicar que apesar do estado do mar se ter agravado, nunca se tinha atingido tal estabilidade. E é verdade que isto tudo me deixa por vezes como boi para palácio, pondo seriamente em cima da mesa a hipótese de existência do absoluto.